"VENDE-SE UMA CAMA. PRINCIPALMENTE O LADO VAZIO!"

Há muitos anos atrás (É pleonasmo?), reencontro um amigo que não via há tempos. Deste nosso encontro, lembro de sua alegria, apresentando-me sua então noiva. Uma loura linda, corpo escultural e inteligência acima da média.

(Afirmo, categoricamente, que nessa observação não vai nenhuma referência ao fato dela ser mulher, loura e, mesmo assim, ser inteligente. Que isto fique bem claro!)

Pois bem, essa apresentação, lembro-me, deu-se numa bela praia cearense, onde esticamos nosso papo até o cair tarde, entre cervejotas e deliciosos caranguejos.

Projetos e sonhos de meu simpático (futuro) casal de parceiros de curtição foram deitados sobre a mesa daquela barraca. Saímos exultantes, quase bêbados e, é bem verdade, também queimados por aquele sol forte de verão nordestino. Na despedida, uma promessa de ambos: uma visita à minha casa para a entrega formal do Convite de Casamento, marcado para daí a poucos meses.

Aguardei. Dias. Uma semana. Duas. Três. Perdi a conta e esqueci (Será?) o assunto. O que teria acontecido?

Meses depois recebo, começo de tarde, em meu escritório, uma ligação sua. Direto e objetivo, ele arremessou:

-E aí, meu velho, como vai? Saudades... Precisamos conversar! Pode ser hoje a noite?!...

-Claro que sim, meu caro!

Curioso, quase que atropelo a sua saudação e seu convite, aceitando-o de imediato. Marcamos para as 20 horas, num restaurante que costumávamos freqüentar.

O resto da tarde transcorreu lentamente; Ansioso queria, logo, saber a causa de seu sumiço. Queria saber de seu casamento (Acontecera?). Das novidades, enfim.

Oito horas da noite em ponto, já acomodado em nossa mesa predileta, o garçom serve-me o primeiro scotch (On the rocks, off course!). Aguardo.

Antes da segunda dose ele chega. Ar cansado, tristonho; Diria que até sofrido!

Como era de seu feitio foi logo disparando:

-Inácio, há quanto tempo!... Acho que foi na praia, quando te apresentei a F..., não foi? Lembra dela? Pois ela não me abandonou a menos de quinze dias de nosso casamento?!...

Fiquei perplexo. Agora entendia seu sumiço, seu ar cansado, sua tristeza, sua dor.

Como quem quer livrar-se de um enorme e pesado fardo, continuou desabafando suas mágoas e dores:

-O pior é que já havia preparado (e até pago!) a festa... Daí, um belo dia, sem mais nem menos, recebo um bilhetinho dela, entregue por uma amiga comum. Simples, objetivo e doloroso.

Abre uma pasta executiva e retira alguns papéis. Mostra-me o primeiro. Era o bilhete fatídico. Leio:

"M...,

Desculpe, mas tudo foi um grande erro.
Estou saindo de sua vida agora e para sempre.
Adeus,

F..."
Conhecendo meu amigo e sabendo da imensa paixão que tinha pela amada, cheguei até a embargar a voz, mas argumentei, sem nenhuma convicção:

-Amigo, a vida prega-nos dessas peças. Talvez tenha sido melhor assim! A sua princesa encantada ainda está por vir. Aguarde-a. Quando menos esperar ela aparece!

Dentre os outros papéis ele sacou uns recortes. Eram de um jornal de grande circulação regional. Mostrou-me os anúncios que mandara publicar nos classificados, oferecendo para venda todos os móveis e utensílios que formariam o "Lar. Doce lar" do casal desfeito. Em tópicos (retrancas, na linguagem técnica) diferentes ele oferecia, fogão, geladeira, móveis em geral. E a cama do destaque deste post. Mostrava-me todos, recortados um a um, detalhadamente e com muita dor.

Eram pura poesia, seus anúncios!...

Ao nosso lado, como quem não está prestando atenção, maitre e garçom, indiscretos devido a antiga convivência, observavam o desenrolar de nossa conversa.

Emocionado, e para disfarçar, finjo a necessidade de ir ao toilete. Levanto-me meio zonzo, sentindo, eu também, a dor de meu amigo. Rumo ao banheiro percebo que também o maitre e o garçom não conseguiram disfarçar as suas próprias emoções. Enxugavam, com lenços de papel, algumas lágrimas incontidas.

O jantar, regado a muito scotch, apesar de delicioso, foi dolorido para todos. Mesmo passado o tempo, meu antigo parceiro de gandaias ainda acusava a sua irreparável perda. Bem no coração.

Dia seguinte, ainda sentindo o peso do excesso de whisky, lembrei-me da história de meu velho amigo. Seus anúncios nos classificados ficaram, indeléveis, em minha memória. Principalmente o da cama, com o lado vazio.

Tempos depois retomamos o contato. Era candidato a cargo eletivo majoritário. Senador. Votei e ajudei em sua campanha. Ia muito bem nas pesquisas eleitorais. Mas não elegeu-se. O mundo político dexou de ganhar um grande valor. E ele teve que absorver mais uma pancada.

Depois desta malsucedida campanha, parece que aplicou a si próprio um castigo, uma pena. Foi seu próprio juiz e algoz. E sumiu.

Nunca mais o vi. Espero que tenha resolvido seu dilema. E que sua cama esteja, hoje, totalmente ocupada. E bem!

P.S.: Anos mais tarde reencontrei a sua (dele) ex-noiva. E rolou, entre nós, um lance incrível! Mas isto é papo para um próximo post. Aguardem.

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